31 maio, 2023

Pétala nº 3784

“Aceitar, aceitar. De tudo fazer caminho. Quando nos dispomos a isso, estamos finalmente a mergulhar numa experiência de amizade. Não apreciamos os nossos amigos apenas pelo que nos dão: podem vir de mãos vazias que os amamos na mesma. Para dizer a verdade, por vezes as coisas, na amizade, só atrapalham.” 

JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA, cardeal, teólogo e poeta português (1965-) in “Uma beleza que nos pertence”, Ed. Quetzal, 2019



Pausa longa, muito, muito longa...

Beijos e abraços, grata pela 
vossa amizade.




(fotos net)


30 maio, 2023

Pétala nº 3783

"Ai de ti e de todos que levam a vida
A querer inventar a máquina de fazer felicidade!"
(Fernando Pessoa)


“Mais tarde na vida esperamos algum descanso, não esperamos? Achamos que merecemos. Eu pelo menos achava. Mas depois começamos a perceber que a vida não tem obrigação de recompensar o mérito.”

“Quanto menos tempo de vida temos, menos queremos desperdiçá-lo. É lógico, não é? Mas a maneira como utilizamos as horas poupadas… isso já é outra coisa que provavelmente não teríamos previsto na juventude.”

JULIAN BARNES, escritor inglês (1946-), in “O sentido do fim”, Ed. Quetzal, 2011


"Toda a gente está sempre a passar por alguma coisa, não é verdade? No fundo a vida é isso. Coisas e mais coisas que temos de ultrapassar."

SALLY ROONEY, escritora irlandesa (1991-), in "Conversas entre amigos" (Conversations with Friends, 2017), Ed. Presença, 2018


(fotos net)

29 maio, 2023

Pétala nº 3782

Cores do meu amanhecer...


"A melhor herança que deixaremos uns aos outros é o amanhecer."

"Tem tanto a ensinar-nos o amanhecer, essa forma indómita e serena em que a terra plasma, a cada 24 horas, o seu (e o nosso) desejo de reviver. A luz tem, nessa ocasião, uma respiração leve, desarmada, discretamente bruxuleante. E quando vemos caminhar a luz a nossa lado com os seus passos pequenos, os seus passos de algodão, os seus trapos infantis ornados de joias tão incríveis compreendemos que também para nós alguma coisa começa. Deveríamos parar mais vezes a contemplar a manhã como um poste de luz que reforça a nossa, como uma robustez que nos sonha, como uma mão estendida que nos defende. Deus está na manhã."

JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA, cardeal, teólogo e poeta português (1965-), in crónica "Amanhecer", publicada na revista "E", do jornal Expresso de 6 Janeiro 2023





                                                              
 (PORTUGAL/Cascais - Parede/S. Pedro do Estoril, 2023)
(fotos tiradas entre as 7.00 e as 7.30 horas)


26 maio, 2023

Pétala nº 3781

"Todo o tempo é de poesia.
Desde a névoa da manhã
à névoa do outro dia."
(António Gedeão)


“Quando o poeta escreve, a sua deriva deverá ser a dos sentimentos em geral. E tem de se perceber.
É assim a poesia.
Um livro de poemas não é algo que se devore instantaneamente. O leitor recebe a poesia preparado para a receber. Não porque um poeta seja uma pessoa diferente das outras. A poesia é que é uma arte distinta, é uma arte de palavras e nada tão difícil de saborear como uma palavra nascida e escrita que pretende dizer sobre a alma, sobre a vida, do mal e do bem, em suma, sobre a Humanidade. (…) 
O que os poetas escrevem não é para nós imaginarmos o que é que eles querem dizer. O que os poetas escrevem é para nós, leitores, interpretarmos conforme os nossos desígnios e o que mais nos convém.” 

CRISTINA CARVALHO, escritora portuguesa (1949-), in “Movimento perpétuo – António Gedeão”, artigo de opinião publicado no jornal Público, 31 Março 2023


Todo o tempo é de poesia.

Desde a névoa da manhã
à névoa do outro dia.

Desde a quentura do ventre
à frigidez da agonia.

Todo o tempo é de poesia.

Entre bombas que deflagram.
Corolas que se desdobram.
Corpos que em sangue soçobram.
Vidas que a amar se consagram.

Sob a cúpula sombria
das mãos que pedem vingança.
Sob o arco da aliança 
da celeste alegoria.

Todo  o tempo é de poesia.

Desde a arrumação do caos
à confusão da harmonia.


ANTÓNIO GEDEÃO (pseudónimo de Rómulo Vasco da Gama de Carvalho)poeta português ( 1906-97), in "Poesias Completas", Ed. Sá da Costa, 1982



(fotos net)

25 maio, 2023

Pétala nº 3780


"Tudo se apagará num segundo. O dicionário acumulado desde o berço até ao leito de morte irá desaparecer. Depois, o silêncio e nenhuma palavra para o dizer. Da boca aberta nada sairá. Nem eu nem mim. A língua continuará a pôr o mundo em palavras. Nas conversas à volta de uma mesa em dia de festa seremos apenas um nome, cada vez mais sem rosto, até desaparecermos na multidão anónima de uma geração distante."
ANNIE ERNAUX, escritora francesa (1940-), in "Os Anos", Ed. Livros do Brasil, 2020
Prémio Nobel de Literatura, 2022


"- Sim. Seremos esquecidos. É assim a vida, nada a fazer. O que hoje nos parece importante, sério, cheio de consequências, pois bem, um dia vai cair no esquecimento, vai deixar de ter importância. E o que é curioso é que não podemos saber hoje o que, um dia, vai ser considerado bom e importante ou medíocre e ridículo. (...) Até pode acontecer que esta vida de agora, que tanto defendemos como nossa, venha um dia a ser considerada estranha, desconfortável, imbecil, não seja suficientemente inocente e, quem sabe, seja até condenável."
ANTON TCHEKHOV, médico, dramaturgo, escritor russo (1860-1904), citado por ANNIE ERNAUX in "Os Anos".

(foto net)

24 maio, 2023

Pétala nº 3779

"Hoje não amanheceu
prolongou-se a noite"
(Luís Raimundo Rodrigues)


“As trevas, dizem, são o reino dos mortos. Não é verdade. Tal como a luz, o escuro só existe para os vivos. Onde os mortos habitam é no crepúsculo, nessa fresta entre dia e noite, onde o tempo em si mesmo se enrosca.”
 
MIA COUTO, escritor moçambicano (1955-), in "A confissão da leoa", Ed. Caminho, 2012


Acabaram as manhãs
Hoje não amanheceu
prolongou-se a noite
porque a tua ausência
adiou as manhãs para sempre.

Dias embalados
O fim da tarde
é o início da morte dos dias
é aí que me encontro
nessa agonia da luz
é aí que fico
com “avé-marias” na boca
na descrença de que
essa cantilena tenha a ver
com o nascer do dia.
Adormeço de cansaço
de tanta vida
embalada em dias de plástico.

Poemas de LUIS RAIMUNDO RODRIGUEShttps://brancasnuvensnegras.blogspot.com/ in "No Espaço da Minha Boca", Ed. Gato Cinzento, 2023



23 maio, 2023

Pétala nº 3778

“Não é nenhuma pérola de sabedoria, mas na prisão aprendi a evitar cruzar o olhar com alguém que estivesse zangado. Aprendi a sentar-me perto da pessoa e a olhar na mesma direcção que ela.“
ABDULRAZAK GURNAH, escritor nascido em Zanzibar, em 1948, a viver em Inglaterra desde a década de 1960, in “Junto ao mar”, Ed. Cavalo de Ferro, 2022 
Prémio Nobel da Literatura, 2021 

… uma prisão é um lugar que afasta do mundo…” 
JOSÉ CARLOS BARROS, arquitecto e escritor português (1963-), in “As pessoas invisíveis” (Prémio LeYa, 2021), Ed. LeYa, 2022

(Obrigada, meu amigo.)



22 maio, 2023

Pétala nº 3777

“Quem se atreve a imaginar os segredos que uma praia esconde durante a noite?”
JOÃO PINTO COELHO, arquitecto, professor e escritor português (1967-), in “Mãe, Doce Mar”, Ed. Leya, 2022

Nas horas em que todos dormem acontecem os eventos mais maravilhosos e as coisas mais terríveis do mundo.” 
SILVINA OCAMPO, escritora argentina (1903-93), in “As Convidadas – A cara na palma”, Ed. Antígona, 2022

(PORTUGAL/Cascais - praia S. Pedro do Estoril)



19 maio, 2023

Pétala nº 3776

Tempo, tempo, tempo...


“Tenho tempo à minha disposição e estou à disposição do tempo, portanto mais vale prestar contas. Mais cedo ou mais tarde, todos temos de o fazer.”

“Toda a gente tem de prestar contas a Deus, mais cedo ou mais tarde, e isso é um assunto entre cada pessoa e o seu Criador.” 
ABDULRAZAK GURNAH, escritor nascido em Zanzibar, em 1948, a viver em Inglaterra desde a década de 1960, in “Junto ao mar”, Ed. Cavalo de Ferro, 2022 
Prémio Nobel da Literatura, 2021


"Na convivência, o tempo não importa. Se for um minuto, uma hora, uma vida. O que importa é o que ficou deste minuto, desta hora, desta vida.
Lembra que o que importa é tudo que semeares colherás. Por isso, marca a tua passagem, deixa algo de ti, do teu minuto, da tua hora, do teu dia, da tua vida."
MÁRIO QUINTANA, poeta brasileiro (1906-94)


“Cada dia que passa, e até mesmo cada hora de cada dia que passa, substitui e remete à irrelevância o tempo anterior, e os acontecimentos nas nossas vidas fazem sentido apenas em relação a uma cronologia de conteúdo noticioso em permanente atualização.”
SALLY ROONEY, escritora irlandesa (1991-), in "Mundo Belo, onde Estás" (Beautiful World, Where Are You, 2021), Ed. Relógio D'Água, 2021


(fotos net)

18 maio, 2023

Pétala nº 3775

“É fácil viver no mundo conforme a opinião das pessoas. É fácil, na solidão, viver do jeito que se quer. Mas o grande homem é aquele que, no meio da multidão, mantém com perfeita doçura a independência da solidão.”
RALPH WALDO EMERSON, escritor norte-americano (1803-1882)

"Talvez algum dia a solidão venha a ser adequadamente reconhecida e apreciada como mestra da personalidade. Há muito que os orientais o sabem."
ALBERT EINSTEIN, físico alemão (1879-1955)

(foto Pexels)


17 maio, 2023

Pétala nº 3774

“Este sol, não sei se já o disse, 
este sol é o mar todo 
da minha infância.”
(Eugénio de Andrade)

“Não me lembro de nenhuma manhã africana em que não acordasse feliz.”

ERNEST HEMINGWAY, escritor norte-americano (1899-1961), in “Verdade ao amanhecer (True at first light, publicação póstuma 1999)”, Publicações Dom Quixote, 2001
Prémio Nobel de Literatura, 1954





(Praias do sul de Moçambique: Maputo, Bilene, Ponta do Ouro, Xai-Xai. Fotos net.)


16 maio, 2023

Pétala nº 3773

“O futuro: uma história alternativa” (excerto) 


“Alguém já caracterizou aquilo a que chamamos de progresso como o avanço irreversível da ideia de liberdade. Será? Já foi mais do que é, assim nos dizem os sinais. 
Diz-se que o presente faz o passado e o futuro, ao mesmo tempo. Quanto ao futuro da liberdade, já há gente de mãos juntas a pôr-se de joelhos. Acabaram-se as certezas. Temos a sensação de que o futuro está a ser feito à nossa frente, mas sem a nossa participação. Além da hipótese mais feia, de mais e mais guerra, há um futuro B à nossa espreita, um futuro que não queremos. (…) O futuro desorganizou-se, confunde e assusta, assola-nos com novidades para as quais não conhecemos a resposta, que ameaçam os fundamentos da democracia liberal. 
A pergunta impõe-se: vamos deixar o futuro dispersar a liberdade e a democracia?” 

JOSÉ TAVARES, professor na Universidade Nova de Lisboa, investigador, doutorado em Economia, in “O futuro: uma história alternativa”, publicado na revista "E", do jornal Expresso de 13 Janeiro 2023


15 maio, 2023

Pétala nº 3772

“O que se passa com o presente que está sempre ansioso por julgar o passado?" 
JULIAN BARNES, escritor inglês (1946-), in “O homem do casaco vermelho”, Ed. Quetzal, 2021

“O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente...” 
MÁRIO QUINTANA, poeta brasileiro (1906-94)


(MALDIVAS, 2022)



12 maio, 2023

Pétala nº 3771

"Eis Veneza, a beleza bajuladora..."


"... os seus passos seguiam as ordens do demónio que se compraz em espezinhar a razão e a dignidade."

“Amava o mar por razões profundas: a necessidade de repouso do artista fatigado que tenta encontrar abrigo na vastidão não complexa para as muitas formas e caprichos da sua fantasia; uma inclinação, contrária ao seu trabalho e logo também mais apetecível, para o desmedido, para o incomensurável e eterno, para o nada. Repousar na perfeição é o desejo de todos os que procuram a excelência; e não será o nada uma forma de perfeição?” 


"Pensamento que se torna emoção, emoção que se torna pensamento: eis a fortuna do poeta. Este pensamento latejante, esta emoção precisa, pertenciam e obedeciam então ao homem solitário: diziam-lhe que a natureza estremece em êxtase quando o espírito se prostra aos pés da beleza."


"Imagens e percepções, que um olhar, um sorriso, uma troca de impressões levariam a ignorar, ocupam-no sobremaneira, ganham profundidade no silêncio, ganham sentido, tornam-se vivência, aventura, sensação. A solidão é propícia ao original, ao estranhamento e ousadia do belo, à poesia. Mas gera também o perverso,  o monstruoso, o absurdo e o ilícito."

THOMAS MANN, escritor alemão (1875-1955), in "A Morte em Veneza" (1912), Ed. Relógio D’Água, 2004
Prémio Nobel de Literatura, 1929
Imagens do filme “Death  in Venice” (1971), adaptado e realizado por Luchino Visconti, protagonizado por Dirk Bogarde, com banda sonora de Gustav Mahler.


(fotos net)


10 maio, 2023

Pétala nº 3770

O amor é um sentimento, mas é, sobretudo uma relação. (…) 
O amor começou a ser servido como adjetivo para tudo, banalizando uma das palavras mais carregadas de força do nosso léxico. Usar a mesma palavra que serve para definir a relação com alguém, para um prato de bacalhau ou para um qualquer ator ou cantor, é tornar trivial o sentimento mais estruturante do nosso ser. Posso viver sem «amar» uma feijoada, mas não conseguiria sobreviver sem amar e ser amado.” 

JOSÉ GAMEIRO, psiquiatra português (1949-), in crónica “Amar”, publicada na revista "E", do jornal Expresso de 16 Dezembro 2022




08 maio, 2023

Pétala nº 3769

“Poderá um eu falar de si mesmo sem que soe heroico, sem que pareça oprimido, defendendo o indefensável, enchendo-se de rancor perante o inexorável?”

“… o valor do silêncio, o perigo das palavras.”

ABDULRAZAK GURNAH, escritor nascido em Zanzibar, em 1948, a viver em Inglaterra desde a década de 1960, in “Junto ao mar”, Ed. Cavalo de Ferro, 2022 
Prémio Nobel da Literatura, 2021

(CABO VERDE - Ilha da Boa Vista, 2022)

 

05 maio, 2023

Pétala nº 3768

Adélia & Cecília


"É roxo o amor, de amoras não, de dor."

COM LICENÇA POÉTICO
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

ADÉLIA PRADO, filósofa, professora, contista e poetisa brasileira (1935-)


"Eu deixo aroma até nos meus espinhos."

MOTIVO
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

CECÍLIA MEIRELES, jornalista, escritora e professora brasileira (1901-64)




(fotos net)

03 maio, 2023

Pétala nº 3767

“O céu não tem fronteiras. Não temos, no fundo, de falar outra língua, não temos de fazer nada especial, porque o céu é aquilo que nos cobre continuamente” 

“Sobre a terra, as coisas todas vão morrendo e nascendo, renascendo e voltando a morrer, enquanto o céu permanece sempre.” 

JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA, cardeal, teólogo e poeta português (1965-) in “Uma beleza que nos pertence”, Ed. Quetzal, 2019

(PORTUGAL/Cascais - Parede/S. Pedro do Estoril, 2023)


01 maio, 2023

Pétala nº 3766

“Meu Deus, como é que vou endireitar a minha existência? (…) 
Proporção, é isso mesmo. Traçares a tua vida como um jardineiro prudente, arando e semeando.”
JOHN DOS PASSOS (John Roderigo Dos Passos, oriundo de uma família portuguesa, Madeira), escritor e pintor norte-americano (1896-1970), in “Manhattan Transfer” (1925), Ed. Presença, 2009

O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim terás o que colher. ”
CORA CORALINA (Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas), contista e poetisa brasileira (1889-1985)  


(foto net)